9/19/2024

Saudade das pequenas coisas



Não sou agarrado aos sonhos de menino

De voar e aproveitar a inclinação do terreno 

De levar à prática o escorregar na laje, ainda que fosse motivo de castigo 

Ainda assim tenho saudades de coisas simples 

Lembro como no Verão dormia a sesta 

Não necessitava de ir para o quarto 

Ficava na chamada loja, a arrecadação da casa no piso térreo 

Tinha duas arcas de milho de madeira, dormia sobre uma delas

Tenho saudades desse tempo simples

Como do som da água a descer do centro da aldeia por um rego pelos lameiros

Tinha um som em espiral, como uma filarmônica a tocar a natureza 

Tenho saudades do momento da piqueta na azáfama das tarefas do campo

Lembra-me o cuidado que os meus avós dedicavam à nossa alimentação e educação

Poderia ser apenas pão de milho com azeitonas

Mas nunca faltou esse instante de paragem e recuperação de energias

Na época da fruta tinha sempre esse complemento 

Fazia o mesmo com pequenos pepinos criados na vinha

Essa piqueta era acompanhada de um pouco de vinho tinto

Antes dos meus 15 anos decidi deixar de beber, retomei décadas depois

Tenho saudades de momentos em que agia como viciado 

Quando encontrava um velho jornal não dava atenção a mais nada

O mesmo acontecia quando encontrava uma pinha mansa com pinhões

Ou quando pegava na navalha e tentava esculpir algo na madeira


José Gomes Ferreira 

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